Pesquisa mostra que pacientes com Alzheimer têm até três vezes mais chances de desenvolver quadros graves de covid-19

Os pesquisadores Sergio Verjovski-Almeida, professor titular do Instituto de Química da USP, e Sergio Ferreira, professor titular de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concluíram que pacientes com demência  — ou, especificamente, com doença de Alzheimer  — apresentam risco três vezes maior de infecção pelo vírus da covid-19 do que pacientes sem essa condição. A pesquisa ainda aponta que pacientes portadores de demência têm maiores chances de serem hospitalizados, com maior gravidade de quadro clínico e que a chance de óbito é duas a três vezes maior quando comparados aos livres de demência e também hospitalizados.

O estudo identifica um possível novo grupo de risco em meio à pandemia e revela a urgência dos serviços de saúde dedicarem atenção especial aos portadores de doenças degenerativas do sistema nervoso. O artigo Dementia is an age-independent risk factor for severity and death in COVID-19 inpatients foi publicado nesta quarta-feira, na revista científica Alzheimer’s & Dementia: The Journal of the Alzheimer’s Association (https://alz-journals.onlinelibrary.wiley.com/journal/15525279).

A demência é a descrição de um conjunto de sintomas de doenças degenerativas do sistema nervoso, que implicam a perda progressiva das funções do cérebro, o que compromete a memória, habilidades cognitivas e o raciocínio, por exemplo. A forma mais comum dos casos é a doença de Alzheimer, que afeta a memória e é o principal fator encontrado pelos pesquisadores que explica a observação de casos mais graves de covid-19 entre idosos.

Sergio Verjovski-Almeida – Foto: Lattes

Para isso, os cientistas analisaram em larga escala as informações de um banco de dados de saúde do Reino Unido, o UK Biobank, que registra desde 2006, para cerca de 500 mil voluntários, os atendimentos no serviço público de saúde britânico. Ao avaliar um grande número de indivíduos, com históricos detalhados de doenças preexistentes e em um país com alta testagem de covid-19, foi possível correlacionar comorbidades com maiores incidências de casos e óbitos pelo coronavírus.

Os dados de idosos foram avaliados por estratificação etária (65 a 74, 75 a 79 e de 80 acima) e notou-se que a idade não era um fator determinante para o agravamento dos casos. No que se refere às comorbidades, os dados mostraram que, enquanto condições de alta pressão arterial aumentaram em no máximo 30% as complicações clínicas e histórico de câncer e de asma diminuíam a incidência de casos, portadores de demência apresentavam um risco significante de infecção, agravamento e óbito. Em média, em portadores de Alzheimer, havia três vezes mais chances de infecção e de agravamento dos casos quando hospitalizados, podendo levar a óbito. Os resultados ainda mostram que, na faixa etária mais elevada, o risco aumentava em até seis vezes.

Sergio Ferreira – Foto: Arquivo Pessoal

“O mais interessante é que os dados revelam que esse aumento não se dá devido às condições de cuidado, nem de manifestação da doença”, afirma Verjovski-Almeida. O pesquisador explica que essa diferença comparativa não ocorre pelos prejuízos às habilidades cognitivas, de compreensão e locomoção comprometidas no Alzheimer ou Parkinson, que poderiam ser relacionadas ao descumprimento das medidas de higiene. E também não se trata de uma maior exposição vinda de suporte médico hospitalar.

Estudos já relacionam demência e casos de covid-19, mas atribuindo estes últimos como fator propiciador de doenças degenerativas. O estudo é inédito em apontar o inverso: a evidência é de que podem existir aspectos genéticos do Alzheimer que levam ao agravamento significativo da covid-19 e destaca a importância de direcionar o atendimento de saúde aos cuidados desse grupo, o que, segundo Verjovski-Almeida, pode evitar óbitos.

Mas, como o Alzheimer implica a piora dos quadros de covid-19 ainda não é claro.

“Sabendo-se que o Alzheimer está relacionado com uma inflamação dos vasos do cérebro, a nossa hipótese é que essa inflamação facilitaria a permeabilidade do vírus no cérebro, o que permitiria a infecção do sistema nervoso central.”Sérgio Verjovski- Almeida

Verjovski-Almeida destaca que uma raiz genética pode estar por trás dessa relação. O próximo passo da pesquisa é avaliar alterações de genes que se correlacionem com os pacientes mais graves ou que foram a óbito utilizando outra informação fornecida pelo UK Biobank: o sequenciamento genético dos pacientes. De acordo com ele, essa é uma das maiores vantagens de fazer uso do banco britânico, que, diferente dos desenvolvidos recentemente no Brasil, apresenta um histórico longo e detalhado. “Quando esse banco foi criado, não se imaginava que teria esse tipo de uso, mas está tendo”, afirma.

“É importante investir em pesquisa em banco de informações clínicas e genéticas que permitam informações como essa, antes das crises. Esse é um exemplo da importância de pensar em investimento em saúde a longo prazo”, completa.

Fonte: Jornal da USP

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