Fonte: Jornal da USP
Entenda as diferenças da derme e produzir cosméticos específicos para pessoas com diabete têm impacto na saúde e autoestima.
De acordo com dados da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), em 2021, 15,8 milhões de brasileiros tinham a doença que, entre outros problemas, afeta a pele e a autoestima. Pensando nisso, pesquisadoras da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP desenvolveram e testaram formulações cosméticas com extrato de semente de girassol e alga vermelha, que ajudaram a controlar as alterações da derme decorrentes da condição.
A diabete é caracterizada por altas taxas de açúcar no sangue devido à falta ou má manutenção do metabolismo da glicose. Segundo a professora Patrícia Maia Campos, coordenadora do Núcleo de Estudos Avançados em Tecnologia de Cosméticos, a doença causa o aumento de produtos de glicação (AGE) — reação entre glicose e moléculas como proteínas, ácidos nucleicos e lipídios, envolvida com o processo de envelhecimento —, que provoca danos nas fibras de colágeno da pele.
Para um melhor entendimento desse tipo de pele e como os cosméticos devem agir nela, a pesquisa foi dividida em duas fases: caracterização da pele e estudos clínicos com os extratos.
Características da pele diabética
Para compreender as características específicas dos AGE, parte da pesquisa foi voltada para análise da pele de pessoas com diabete em comparação com pessoas saudáveis; os resultados foram publicados na revista Life. “Neste trabalho, nosso objetivo era entender por que a pele do diabético é mais sensível, por que envelhece primeiro, por que as feridas demoram muito para cicatrizar. A ideia foi analisar as propriedades morfológicas da pele, por medidas instrumentais e clínicas, para melhorá-la usando alguns produtos específicos para diabete”, resume Patrícia Campos.
As pesquisadoras analisaram a pele da face de 28 mulheres, entre 39 e 55 anos, das quais metade tinha diabete tipo 2 e o restante era saudável. Os testes foram realizados por Microscopia Confocal de Reflectância (RCM), técnica avançada de imagem que permite a análise mais profunda da pele de modo não invasivo, sem necessidade de biópsia, observando alterações na morfologia do colágeno e do microrrelevo. Outros equipamentos avaliaram fatores como a elasticidade, rugas e a perda transepidérmica de água (evaporação passiva através da pele).
As técnicas de análises usadas no estudo (RCM), não só para a pele diabética mas em geral, possibilitam que os profissionais vejam alterações na derme que ainda não se manifestaram visualmente, como, por exemplo, na estrutura do colágeno. “Esses métodos vão dar suporte na definição de uma estratégia para elaborar a formulação adequada de cosméticos para esse público específico”, destaca a professora.
As pesquisadoras observaram que a derme diabética sofre maior perda transepidérmica de água, ou seja, a hidratação é prejudicada. “Há uma proteção natural chamada função barreira da pele, que está ligada com a sensibilidade. Se houver comprometimento dessa função pela alta perda transepidérmica de água, significa que há danos nessa barreira cutânea”, explica. Alguns sinais podem ser a pele avermelhada, maior sensibilidade e coceira.
Segundo o estudo, a pele de pessoas com diabete também possui menos firmeza, porque o colágeno é menos denso e apresenta uma estrutura desordenada na derme. Patrícia Campos aponta que, por causa desse fator e do ressecamento, essa pele tem uma textura diferente, mais flácida.
“Esse conhecimento é importante porque em termos de envelhecimento da pele isso pode incomodar e prejudicar a qualidade de vida e bem-estar do paciente. Também, para prevenir algumas doenças e cuidar de cicatrizes, porque a perda de água deixa a pele seca e mais suscetível a dermatite de contato [irritação]”, diz.
As formulações cosméticas
Levando em conta as diferenças da pele diabética estudadas e como essas características afetam a autoestima de mulheres, a pesquisadora Verônica Rego Moraes, em seu doutorado, estudou e desenvolveu formulações cosméticas com extratos naturais para atender às necessidades específicas para o rosto de pessoas com diabete. Os ativos aplicados, de alga vermelha e semente de girassol, foram escolhidos pelo seu efeito de antiglicação e não haviam sido analisados na pele diabética anteriormente a esse estudo.
A pesquisadora explica que essa parte do estudo, além de ser importante para o bem-estar físico, impacta a forma como as pacientes se veem. “É sobre autoestima também. O rosto geralmente é mais visado. Com uma pele mais sensível é complicado achar produtos, entre outros, que sejam focados para esse tipo de pele”, diz Verônica Moraes.
O estudo clínico recrutou 59 mulheres, entre 39 e 55 anos, e as separou em três grupos: aquelas que usaram apenas um produto cosmético já existente no mercado, aquelas que usaram o produto com o extrato de alga vermelha e aquelas que usaram o cosmético com a associação dos extratos de alga e de semente de girassol. A aplicação dessas fórmulas foi feita durante 90 dias.
Os resultados dos grupos que usaram os extratos mostraram diferenças significativas nas mudanças da pele decorrentes do processo de glicação das pacientes. Com as técnicas de imagem RCM foi possível identificar melhora nos padrões de colágeno e espessura da derme. A fórmula que continha apenas extrato de alga vermelha mostrou resultados mais promissores, como aumento da densidade dérmica.
“Percebi que elas se sentiam valorizadas com essa formulação, o que foi muito gratificante. Elas realmente gostaram e todas falaram que comprariam. Então, podemos observar a melhora na qualidade de vida e na autoestima dessas mulheres”, conta.
As formulações foram produzidas para a pesquisa conduzida no Núcleo de Estudos Avançados em Tecnologia de Cosméticos da FCFRP e, por hora, não há projeto para sua produção e comercialização, apesar de ser de interesse de Verônica Moraes.
Referências:
Redação. Cosméticos com extrato de alga e girassol podem beneficiar pele diabética. Jornal da USP, 2023.
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