Atleta com síndrome de Down colabora em pesquisa sobre inclusão no esporte

Pesquisa da USP e da Ufam partiu de entrevistas com paratleta para compreender seu relacionamento com o esporte em um contexto de inclusão

Retirado do: Jornal da USP

Escrito por: EEFE Editado por Guilherme Ribeiro, estagiário sob supervisão de Tabita Said

Pesquisadoras da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP e da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) analisaram a experiência de uma atleta do nado artístico com síndrome de Down, para explorar essa relação sob a perspectiva de uma pessoa com deficiência. Nos relatos, o grupo observou sentimentos de superação, euforia, nervosismo e calma. 

O estudo Ser-esportista: a experiência vivida no nado artístico por uma atleta com síndrome de Downpublicado em agosto de 2023 no periódico Motrivivência da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), foi realizado por Marina Ferraz de Toledo Nigosky e Enoly Cristine Frazão da Silva, da EEFE, e Lionela da Silva Corrêa, da Ufam, sob orientação da professora Michele Viviene Carbinatto, doutora em Educação Física pela USP.

Trocando experiências

Praticante de nado artístico desde os 14 anos, a atleta, hoje com 19, já participou de diversas competições e eventos. Para manter sua identidade anônima, o estudo utilizou o pseudônimo “Ariel”, em referência à personagem da Disney que representa uma sereia, figura mitológica com quem a nadadora disse se identificar.

As autoras do estudo conheceram a atleta por meio do Instituto Inspiração Paradesportiva (Inspara), que promove a inclusão de pessoas com deficiência no nado artístico. Ela foi escolhida com base em diversos critérios, como ser adulta, com síndrome de Down, participante de eventos competitivos, do sexo feminino e conseguir se comunicar de maneira independente ou com pouco auxílio. 

Para coletar os dados, dois encontros foram feitos com Ariel. No primeiro, a atleta falou sobre sua experiência no esporte. No segundo, as pesquisadoras pediram que ela trouxesse objetos significativos em sua trajetória como nadadora artística e contasse sobre eles. 

Após os encontros, as entrevistas foram transcritas e examinadas, baseadas na teoria de Merleau-Ponty, que defende que o corpo é uma totalidade – não é um objeto em si, mas uma presença corporal no mundo.

Fotos, medalhas, crachá e maiô

Entre os objetos levados por Ariel estavam fotos, medalhas, um crachá de credenciamento e um maiô. Em uma dessas fotos, é possível ver o momento em que a atleta flutua relaxada na água. Nas entrevistas, ela conta que, dentro da piscina, a tensão de fora dá lugar à calma. Segundo ela, estar lá é como estar em casa e, por isso, considera-se uma sereia.

Do ponto de vista filosófico abordado pelo estudo, o simples contato com a água é suficiente para despertar diversas sensações. O meio aquático pode trazer à memória o tempo da gestação, quando o líquido amniótico envolve o embrião no ventre materno, fazendo com que os nadadores sintam identificação com o ambiente, por exemplo.

Outros itens expressivos escolhidos por Ariel foram nove de suas medalhas. Ela contou como cada uma representa sua evolução no esporte. De acordo com as pesquisadoras, os troféus refletem sua própria superação e evidenciam sua vontade de ser notada como esportista. 

O relato feito pela nadadora também mostra que seu prazer não se limita em ganhar as competições. Ele reside na prática diária, nos treinos, nas relações que mantém com seus colegas, sua família e até mesmo com a plateia. 

Esporte e a pessoa com deficiência

Praticar atividade física nem sempre foi algo possível para todos. De acordo com a pesquisa, ainda hoje, o acesso de pessoas com deficiência ao mundo esportivo possui diversas limitações. Estudar a perspectiva de uma atleta com síndrome de Down sobre o nado artístico também foi uma forma de defender a inclusão dessa população nos esportes.

De acordo com as pesquisadoras, “revelar a percepção da experiência da nadadora pode inferir em mais respeito e afeto  pelos  profissionais  envolvidos  com  e  no  esporte,  mais  oportunidade  e  locais  de  prática suportados  por  políticas  públicas,  mais  práticas  corporais  e  poder  de  escolha  pelas  pessoas  com síndrome de Down, e mais acesso e maior permanência no esporte. Enfim, um processo inclusivo, de fato”.

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